pedropaulo - 15/10/2005 11:04 PM
GTA é um "jogo" diferente. Único. Retrata uma sociedade desleal, injusta, racista e violenta. Retrata a nossa sociedade. E fá-lo com tal mestria que a fronteira entre a realidade e a ficção se dilui nos olhos e mente de alguns jogadores. A sociedade sempre tentou encontrar motivos para o colapso social progressivo. A religião, a musica quer sobre a forma de rap dos anos 80-90 de Public Enemy ou de 2Live Crew, ou sobre a forma de bandas tão distintas como Deicide, Motorhead, Boy George, Iron Maiden ou o mais recente Marilyn Manson. A incapacidade de lidar com o fracasso familiar e educacional criou uma expiação fácil em direcção a alvos fáceis.
È ingénuo supor que os "jogos" são a causa de comportamentos violentos. Mas tb o é ilibar por completo títulos "malditos".
Concordo que é ingénuo supor que os jogos são a causa de comportamentos violentos, mas ilibar os jogos "malditos" (não sei
porque lhes chamas malditos, mas pouco interessa), não considero ingénuo. Considero sim, um pouco de bom senso.
Como disseste e bem, os jogos estão a atingir a maturidade, como tal, devem ter uma oferta cultural capaz de abranger todo o tipo de jogadores (como no cinema ou na música). Para que isso se concretize deve haver liberdade de expressão para criar mundos realistas, mesmo que isso doa a muita gente. GTA é uma sátira da nossa sociedade (americana sobretudo), e não vejo motivo nenhum para o culpar de algo que não seja o ser uma obra-prima, capaz de suscitar reacções por todo o mundo.
Banir ou excluir da circulação mainstream jogos como estes, é uma forma de extremismo Grave. É um erro, interfere com o
direito democrático de liberdade de expressão, e pior que isso molda a arte, a criatividade e a imaginação.
Para além disso, como se poderia criticar a sociedade (nas tuas palavras: "desleal, injusta, racista e violenta") sem a retratar???
Como se muda algo que não se conhece? Mesmo tu só és capaz de o fazer, porque viste o seu retrato em filmes, noticiários e documentários. Banindo a violência (concretizada ou não) desses actos banes também a capacidade de luta a essa violência, porque ela deixa de existir no imaginário social.
Criar jogos em que os mundos sejam todos perfeitos, sem violência, nem nudez, nem palavrões, incorre um risco gravíssimo, o de adormecer as pessoas intelectualmente, levando-as a pensar que o nosso mundo é perfeito, como acontece por exemplo nas
telenovelas portuguesas. Não será isso mais perigoso do que apresentar certos aspectos mais duros da realidade???
Não quero por isto dizer, que se deva incentivar a violência na arte, mas sim que esta tem de existir como forma de encarar a realidade.
Não vivemos numa sociedade equilibrada. Procuramos que o que nos rodeia e o que criamos reflicta a utopia que almejamos. Mas à espreita estão grupos que ganham dinheiro, que faz girar o mundo, não com obras luminosas, mas sim com retratos duros e feios do que somos qualquer que seja o seu formato.
Terá GTA sucesso entre os jogadores de bairros violentos? Talvez não porque o nível de ficção presente no jogo é ultrapassado pela realidade de quem os joga. Porque procuramos fazer num jogo algo que nunca faríamos na realidade? Porque nos dá prazer e nos diverte roubar, estropiar fugir? Porque é virtual. Porque ai não pagamos pelos nossos erros. Somo imunes e podemos desligar quando quisermos.
Mas, numa sociedade desequilibrada, surgem desequilíbrios nas pessoas. Familiares, fisicos, mentais ao ponto de o conceito de "normal" ser hoje quase um insulto. Um "jogo" tem hoje um poder de influência quase como o de um livro. Se nos tocaram e porventura ajudaram a moldar a personalidade porque não pode um jogo ser capaz?
. Serão os jogos a génese de todo o mal? Não. Mas fazem parte do mal. Como o cinema violento, a musica que glorifica a violência ou a politica extremista.
O futuro de GTA é sombrio. È de esperar que a nova geração lhe de melhores gráficos uma cidade maior mais acção. Mais real. À espreita estarão muitas vozes e acções. Provavelmente não estarão presentes aquelas que mais importam. A dos pais.
Com resolver a questão? Proibir de jogar o jogo? Porque não pode o Francisco jogar quando na escola toda a gente joga? Deixa-lo jogar? Por mais que insistam na nossa sociedade a linha e entre realidade e ficção é ténue. E a vontade de a ultrapassar é real. Que o digam quem explodiu ao imitar o Macgyver ou voou do quinto andar porque viu o Super-homem faze-lo. Jogar o jogo com o filho. Ironizar a violência do jogo, converter um jogo de 18 anos para a escala de um miúdo de 8. Tirar do jogo o principal objectivo do jogo. Divertimento. La está. Utópico. E nos vivemos no caos social. Não haverá pais a jogar GTA com os filhos em grande número. Vão morrer pessoas não por causa dos jogos mas da sociedade. Mas dizer isto é ir pelo caminho mais fácil. È facil culpar a sociedade. Se nos lembrarmos que fazemos parte dela a tarefa é mais difícil.
Deixavam o vosso filho de 8 anos jogar GTA sozinho? Afinal é só um jogo.........
Então afinal qual é a tua solução? Banir todo o pedaço de literatura que encarou a realidade como ela é?
Acabar com o cinema violento? Destruírias tantas obras primas da criatividade humana, só porque têm aspectos
menos bonitos da realidade? Acabar com o Super-Homem e como o Macgyver? Ícones da nossa sociedade que nem sequer eram apologistas da violência? Aliás qualquer um deles eram defensores da paz e da não-violência! E no entanto, como tu pões tão
eloquentemente, provocaram mortes! Não por serem violentos mas porque existe um desiquilíbrio psicológico grave nas pessoas!!!
E culpar a sociedade não é a saída fácil. Muito pelo contrário: é a difícil, porque tornar mundos virtuais mais perfeitos e equilibrados é fácil, tornar a nossa sociedade mais justa, equalitária e livre de violência, é muito difícil, atrever-me-ia a dizer quase impossível.
E enquanto não encararmos este problema de frente, destruíndo a sua raiz, nunca mudaremos o estado das coisas...
E sim, deixava o meu filho de 8 anos jogar GTA (embora não o encorajasse..), salvo se ele tivesse alguma perturbação mental. Conheço crianças mais novas que o jogam, e não são nenhuns psicopatas por isso. Pessoalmente, prefiria que apenas tivessem acesso a esse mundo mais tarde, mas é a minha opinião particular.
Em vez de culpar os jogos, culpem-se a vocês mesmos, alterem-se, melhorem-se, tornem-se mais "humanos" e solidários e lutem para que esta sociedade se altere, de dentro para fora, e pode ser que assim isto alguma vez mude para melhor.
É, obviamente, uma utopia, mas se não acreditarmos nela, mais vale não acreditarmos em nada.